Um dos campos mais promissores é o da tecnologia fotovoltaica. Protótipos de células solares feitas com perovskitas apresentaram eficiência superior à de células comerciais à base de silício (estrutura espacial da molécula de iodeto de chumbo e metilamônio; imagem: Christopher Eames et al.)
Um dos campos mais promissores é o da tecnologia fotovoltaica. Protótipos de células solares feitas com perovskitas apresentaram eficiência superior à de células comerciais à base de silício
Um dos campos mais promissores é o da tecnologia fotovoltaica. Protótipos de células solares feitas com perovskitas apresentaram eficiência superior à de células comerciais à base de silício
Um dos campos mais promissores é o da tecnologia fotovoltaica. Protótipos de células solares feitas com perovskitas apresentaram eficiência superior à de células comerciais à base de silício (estrutura espacial da molécula de iodeto de chumbo e metilamônio; imagem: Christopher Eames et al.)
José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – Devido ao seu potencial de aplicação, as perovskitas tornaram-se um dos materiais mais estudados no momento. Um campo de aplicação especialmente promissor é o da tecnologia fotovoltaica, que trata de dispositivos capazes de converter com eficiência energia luminosa em energia elétrica. A eficiência de conversão apresentada por perovskitas híbridas está hoje em torno de 25,2%, superando a eficiência das células comerciais baseadas na tecnologia do silício.
Exemplo de perovskita híbrida é o iodeto de chumbo e metilamônio (CH3NH3PbI3). O material é chamado de “híbrido” porque, em sua molécula, os três íons negativos, constituídos pelo iodo (I-), equilibram um íon positivo inorgânico, constituído pelo chumbo (Pb2+), e um íon positivo orgânico, constituído pelo metilamônio (CH3NH3+).
Com foco exatamente no iodeto de chumbo e metilamônio, um estudo conduzido no Departamento de Física e Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Ilha Solteira, avançou na compreensão da natureza ferroelétrica e da origem das propriedades fotovoltaicas excepcionais das perovskitas. Artigo a respeito foi publicado na revista Acta Materialia.
O estudo faz parte da pesquisa de doutorado de Fernando Brondani Minussi, orientada por Eudes Borges de Araújo, professor titular da Unesp. E contou com apoio da FAPESP por meio do Projeto Temático “Materiais multiferroicos e ferroelétricos para conversores de energia: síntese, propriedades, fenomenologia e aplicações”, coordenado pelo professor José Antonio Eiras, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), e que tem Araújo como pesquisador principal.
“Nesse estudo, investigamos de modo sistemático o efeito da temperatura e de um campo elétrico de corrente contínua sobre as propriedades elétricas, dielétricas e espectroscópicas do iodeto de chumbo e metilamônio. E procuramos excluir outras interferências para demonstrar a assinatura característica do relaxor ferroelétrico na perovskita estudada”, diz Araújo.
Aqui cabe uma explicação. Os relaxores ferroelétricos são materiais que têm sua estrutura fortemente modificada em presença de um campo elétrico, devido ao deslocamento dos íons na rede cristalina: os positivos em um sentido e os negativos no sentido oposto. Isso faz com que apresentem alta eficiência no armazenamento e na conversão de energia, uma vez que suas constantes dielétricas são muito maiores do que as dos materiais ferroelétricos comuns.
“Nossos resultados indicaram a natureza de relaxor ferroelétrico do iodeto de chumbo e metilamônio. Mas também evidenciaram que existe uma temperatura de congelamento dos dipolos responsáveis pelo caráter relaxor do material e uma transição de fase difusa em altas temperaturas. Essa temperatura crítica, que afeta a propriedade relaxora, se dá em torno de 270 K [- 3,15 oC], isto é, pouco abaixo do ponto de congelamento da água”, conta Araújo.
O pesquisador informa que a análise dos resultados lhes permitiu propor um diagrama de fases inédito para o sistema constituído pelo iodeto de chumbo e metilamônio, indicando regiões que delimitam a existência de três fases distintas: ferroelétrica, ergódica e não ergódica.
“Os materiais ferroelétricos exibem naturalmente uma polarização elétrica espontânea que pode ser revertida pela aplicação de um campo elétrico externo. Essa ordem ferroelétrica é destruída em altas temperaturas e o material assume uma fase paraelétrica, isto é, não polarizada. Os relaxores clássicos exibem uma fase paraelétrica em altas temperaturas, semelhante em muitos aspectos à fase paraelétrica de um ferroelétrico normal. Resfriando o material abaixo de certo patamar de temperatura, a chamada ‘temperatura de Burns’, aparecem, dentro da matriz, nanorregiões polares, com direções de momentos dipolares distribuídas aleatoriamente. Como essas regiões são altamente dinâmicas e não correlacionadas, dizemos que o relaxor se comporta de maneira ergódica. As nanorregiões polares interagem e congelam abaixo de outra determinada temperatura, caracterizando o chamado estado não ergódico. No entanto, um estado ferroelétrico pode ser induzido a partir de um relaxor não ergódico pela aplicação de um campo elétrico suficientemente forte”, explica Araújo.
Em matemática, a ergodicidade expressa a ideia de que o comportamento médio de um sistema pode ser deduzido a partir da trajetória de um ponto típico. O pesquisador ressalva que o termo “ergódico” não é usado aqui dessa maneira estrita.
Araújo enfatiza que, apesar de não apresentar o comportamento esperado para um relaxor clássico, o caráter relaxor do iodeto de chumbo e metilamônio deve ser uma de suas características intrínsecas, possivelmente eclipsada pela condutividade iônica e pelas características semicondutoras do material.
“Em geral, os relaxores ferroelétricos possuem elevados valores de permissividades dielétricas, excelentes propriedades eletrocalóricas e eletromecânicas e a histerese, isto é, a tendência de o sistema conservar suas propriedades, só é suprimida em temperaturas suficientemente altas. Sob o ponto de vista tecnológico, essas características os tornam fortes candidatos para a produção de sensores acústicos, resfriadores de estado sólido, transdutores e atuadores. Sob o ponto de vista científico, o fato dos relaxores ferroelétricos ainda serem os materiais menos compreendidos na física da matéria condensada constitui um grande estímulo à pesquisa”, resume Araújo.
E acrescenta que os resultados originais e realmente significativos apresentados no estudo em pauta têm potencial para promover mudanças de paradigma na compreensão da natureza ferroelétrica e da origem das propriedades fotovoltaicas excepcionais das perovskitas de haletos. “Acredito que este trabalho traz avanços substanciais para a fundamentação da física desse sistema complexo e fascinante”, diz.
O artigo Effects of frequency, temperature, and dc bias electric field on the dielectric properties of methylammonium lead iodide from the perspective of a relaxor-like ferroelectric pode ser acessado em www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S1359645421006157?via%3Dihub.
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