Moléculas que atacam células e tecidos do próprio organismo foram detectadas no soro sanguíneo de pacientes infectados pelo SARS-CoV-2 que, após a coleta da amostra, evoluíram para quadros moderados ou graves da doença. Descoberta possibilita novas abordagens terapêuticas (ilustração: NIH)
Moléculas que atacam células e tecidos do próprio organismo foram detectadas no soro sanguíneo de pacientes infectados pelo SARS-CoV-2 que, após a coleta da amostra, evoluíram para quadros moderados ou graves da doença. Descoberta possibilita novas abordagens terapêuticas
Moléculas que atacam células e tecidos do próprio organismo foram detectadas no soro sanguíneo de pacientes infectados pelo SARS-CoV-2 que, após a coleta da amostra, evoluíram para quadros moderados ou graves da doença. Descoberta possibilita novas abordagens terapêuticas
Moléculas que atacam células e tecidos do próprio organismo foram detectadas no soro sanguíneo de pacientes infectados pelo SARS-CoV-2 que, após a coleta da amostra, evoluíram para quadros moderados ou graves da doença. Descoberta possibilita novas abordagens terapêuticas (ilustração: NIH)
André Julião | Agência FAPESP* – Um grupo internacional de pesquisadores encontrou, no soro sanguíneo de pacientes infectados pelo SARS-CoV-2, um conjunto de moléculas normalmente presente em doenças autoimunes e que podem sinalizar a severidade dos quadros de COVID-19. O estudo foi publicado na revista Nature Communications. Futuramente, os resultados podem servir como subsídio para tratar casos graves da doença ou mesmo para evitar a evolução do quadro clínico.
“Uma série de trabalhos tem mostrado que essas moléculas que promovem doenças autoimunes sistêmicas, conhecidas como autoanticorpos, também aparecem na COVID-19. Nós encontramos aqueles associados com pessoas saudáveis e outros cujos níveis aumentam com a gravidade do quadro clínico da COVID-19. Foi possível detectar, por exemplo, autoanticorpos contra duas moléculas com níveis aumentados dias antes do paciente precisar de oxigênio. Com isso, esperamos poder prevenir o agravamento dos casos”, explica Otávio Cabral Marques, pesquisador do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) e primeiro autor do artigo.
Marques coordena projeto financiado pela FAPESP dedicado a entender como o sistema imune responde à COVID-19. O trabalho é assinado por pesquisadores de Brasil, Alemanha, Estados Unidos e Israel.
O grupo analisou o soro sanguíneo de 246 voluntários recrutados em comunidades judaicas de seis estados norte-americanos que não tinham tomado nenhuma vacina. Destes, 169 tiveram resultado positivo de COVID-19 em testes de RT-PCR, enquanto os outros 77 testaram negativo e não apresentaram sintomas. O grupo de infectados foi subdividido entre quadros leves, moderados e severos.
Ferramentas computacionais mostraram uma associação entre anticorpos e moléculas do sistema renina-angiotensina que, entre outras funções, produz a proteína ACE2 (enzima conversora de angiotensina 2, na sigla em inglês), à qual o vírus se conecta para infectar a célula humana. Os pesquisadores encontraram ainda anticorpos que tinham como alvo os chamados receptores acoplados às proteínas G (conhecidos pela sigla GPCR), que têm funções relacionadas à inflamação e coagulação, entre outras.
Casos moderados e graves tiveram os maiores níveis de autoanticorpos, enquanto o soro do sangue de pessoas saudáveis e com quadros leves registrou níveis consideravelmente mais baixos.
Potencial terapêutico
Autoanticorpos contra 11 moléculas mostraram-se os mais significantes para definir a gravidade dos casos. Dois deles, conhecidos pelas siglas anti-CXCR3 e anti-AT1R, por exemplo, foram detectados em pacientes que alguns dias após a coleta do sangue para o estudo precisaram de oxigênio suplementar.
CXCR3, contra o qual o primeiro deles é direcionado, é um receptor expresso em linfócitos T ativados, sendo alguns deles células imunes de memória. O receptor controla a migração desses linfócitos para um local com inflamação e ajuda no combate à infecção. AT1R, por sua vez, tem função regulatória no sistema circulatório. O anticorpo que atua contra ele aumenta danos no endotélio, a parte interna dos vasos sanguíneos.
Dentre esses autoanticorpos com maior relação com a gravidade dos casos, os pesquisadores chamam a atenção para a presença do anticorpo contra o receptor conhecido como STAB1. Com função de “lixeiro”, o STAB1 elimina restos de células e outras sobras de danos a tecidos. “Não sabemos ainda a função desse receptor no contexto da COVID-19. No entanto, uma vez que ele tem diversas funções relacionadas à homeostase [equilíbrio] tecidual e resolução de inflamação, acreditamos que possa ser relevante para indicar a gravidade da doença”, diz Marques.
Além de trazer mais evidências sobre como a COVID-19 pode evoluir para uma doença autoimune sistêmica, os pesquisadores apontam caminhos para terapias capazes de bloquear a ação desses autoanticorpos. Medicamentos inibidores da ACE2 e da AT1R, por exemplo, têm sido testados em casos graves de COVID-19. No entanto, ainda sem sucesso. O trabalho tem ainda entre os autores brasileiros Paula Paccielli Freire, que realiza pós-doutorado no ICB-USP com bolsa da Fundação; além de Desirée Rodrigues Plaça (20/11710-2), Gabriela Crispim Baiocchi (20/07972-1) e Dennyson Leandro Mathias da Fonseca (20/16246-2), todos com bolsa FAPESP de doutorado direto.
O artigo Autoantibodies targeting GPCRs and RAS-related molecules associate with COVID-19 severity pode ser lido em: www.nature.com/articles/s41467-022-28905-5.
* Texto atualizado em 01/12/2022.
A Agência FAPESP licencia notícias via Creative Commons (CC-BY-NC-ND) para que possam ser republicadas gratuitamente e de forma simples por outros veículos digitais ou impressos. A Agência FAPESP deve ser creditada como a fonte do conteúdo que está sendo republicado e o nome do repórter (quando houver) deve ser atribuído. O uso do botão HMTL abaixo permite o atendimento a essas normas, detalhadas na Política de Republicação Digital FAPESP.