Pesquisa desenvolvida na empresa Eyetec possibilitou reduzir drasticamente a quantidade de componentes necessários para fabricar o equipamento. Inovação deve ampliar o acesso ao exame (foto: Eyetec/divulgação)
Pesquisa desenvolvida na empresa Eyetec possibilitou reduzir drasticamente a quantidade de componentes necessários para fabricar o equipamento. Inovação deve ampliar o acesso ao exame
Pesquisa desenvolvida na empresa Eyetec possibilitou reduzir drasticamente a quantidade de componentes necessários para fabricar o equipamento. Inovação deve ampliar o acesso ao exame
Pesquisa desenvolvida na empresa Eyetec possibilitou reduzir drasticamente a quantidade de componentes necessários para fabricar o equipamento. Inovação deve ampliar o acesso ao exame (foto: Eyetec/divulgação)
Fábio de Castro | Agência FAPESP – A retinografia é o principal método utilizado por oftalmologistas para examinar a retina de pacientes e diagnosticar uma série de doenças, possibilitando também a prevenção. Porém, o alto custo do equipamento necessário para sua realização – o retinógrafo – limita sua disponibilidade nas clínicas, reduzindo assim o acesso dos pacientes aos exames.
Para resolver esse problema, a empresa paulista Eyetec desenvolveu um novo tipo de retinógrafo que, por conta de sua arquitetura inovadora, poderá custar cinco vezes menos que os modelos disponíveis hoje no mercado.
Com apoio do Programa PIPE/PAPPE Subvenção – que reúne recursos dos programas Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP, e de Apoio à Pesquisa em Empresas (PAPPE), da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), para a inserção de um produto inovador no mercado –, os empreendedores da Eyetec utilizaram novas tecnologias e muito conhecimento de física aplicada para desenvolver o novo retinógrafo.
Por meio da criação de um sistema de iluminação inovador, eles conseguiram uma redução drástica da quantidade de componentes para fabricação do equipamento, possibilitando uma considerável redução dos custos.
"Por causa do alto custo, é comum que o equipamento só esteja disponível em consultórios de especialistas em retina. Com um retinógrafo mais acessível, um especialista em córnea, por exemplo, poderá ter acesso a um equipamento desses e, caso encontre alguma alteração, poderá encaminhar o paciente aos especialistas de forma precoce", diz André Orlandi de Oliveira, coordenador do projeto.
Arquitetura inovadora
De acordo com Oliveira, o grande diferencial do novo produto é a simplicidade de seu processo de produção em comparação ao do retinógrafo tradicional.
"O retinógrafo convencional possui grande número de componentes e todos precisam ser minuciosamente alinhados, elevando os custos de produção. A ideia era reduzir o número de componentes sem perda de qualidade, possibilitando uma redução do custo de produção", afirma.
Segundo ele, a arquitetura convencional dos retinógrafos foi estabelecida em 1969 e, desde então, pouca coisa havia sido modificada.
Um dos fatores responsáveis por encarecer o equipamento é a tecnologia utilizada para a eliminação de reflexos tanto da córnea quanto das próprias superfícies dos componentes ópticos.
"Para que essa tecnologia funcione, é preciso montar diversos componentes fora do eixo óptico da imagem. A minha proposta para simplificar esse equipamento envolvia conceber um sistema óptico totalmente coaxial, ou seja, com todos os componentes ópticos montados em um único eixo", diz Oliveira.
Para isso, o físico optou por substituir determinados componentes da iluminação por um anel de LEDs. "Pudemos fazer isso porque houve um avanço tecnológico que gerou LEDs pequenos o suficiente para formar um anel bem definido."
Com a substituição do complexo sistema de iluminação pelo conjunto de LEDs montados na forma de anel entre a objetiva e o sistema de detecção, o físico garantiu que os reflexos da córnea não ofusquem a imagem da retina e todo o sistema seja montado em um só eixo.
"Para suprimir os reflexos na objetiva, desenvolvemos um sistema intermediário capaz de selecionar precisamente as regiões do anel de LEDs que iluminam a objetiva e o olho. Sabendo onde o reflexo será gerado, podemos eliminá-lo antes que ele chegue à objetiva", explica.
Essa simplificação de toda a arquitetura do equipamento, segundo Oliveira, favoreceu o seu desenvolvimento desde a etapa de projeto até os processos de alinhamento e montagem. "Foi por isso que conseguimos reduzir muito os custos de produção", diz.
Segundo o pesquisador, estima-se que o produto vá custar cinco vezes menos que US$ 50 mil, o atual preço dos modelos importados que predominam no mercado brasileiro.
O pesquisador ressalta que o retinógrafo é fundamental para diagnosticar doenças como descolamento de retina, degeneração da mácula, glaucoma e a degeneração macular relacionada à idade. Além disso, os exames da retina também podem ser úteis para detectar problemas relacionados à circulação e ao cérebro, por exemplo.
“A Organização Mundial da Saúde [OMS] estima que 80% dos mais de 900 milhões de casos de perda visual registrados no mundo poderiam ter sido prevenidos ou curados com simples exames rotineiros de retinografia”, diz Oliveira.
União de competências
O conceito do novo retinógrafo foi desenvolvido por Oliveira por meio de um projeto PIPE fase 2, ao longo de seu doutorado em física aplicada, defendido em 2017 no Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (IFSC-USP).
O físico explica que, depois de desenvolver o protótipo, era preciso procurar uma empresa experiente capaz de transformá-lo em um produto comercial. Ele já conhecia os empreendedores da Eyetec, que nasceu dentro do IFSC-USP em 1992 e já está no mercado com diversos equipamentos oftalmológicos. Por essas razões, em 2018 ele se associou à empresa.
"Além de ser muito custoso criar uma empresa do zero, o processo de certificação para equipamentos de uso médico é muito longo e complexo. Eu sabia que a Eyetec tinha a necessidade de lançar um novo produto e resolvemos trabalhar juntos", explica.
Durante o projeto PIPE fase 3, a Eyetec desenvolveu o desenho do produto, suas partes optomecânicas, eletrônicas e de software, com o objetivo de oferecer um produto robusto capaz de fazer retinografias de alta qualidade com uma interface amigável para o usuário.
Segundo Silvio Antonio Tonissi Junior, cofundador e diretor da Eyetec, ao contrário da maior parte dos equipamentos anteriormente produzidos pela empresa, o novo retinógrafo também foi projetado com a tecnologia embarcada – isto é, um equipamento que possui um display que contrata seus softwares internamente, sem necessidade de configurar um computador para que seja possível operá-lo.
"O PIPE nos ajudou muito, porque além dos recursos financeiros para o projeto em si, que foram fundamentais, nos permitiu desenvolver soluções – softwares, rotinas e hardwares – que agora serão aproveitadas em outros equipamentos nossos. Além disso, não tínhamos nenhum produto com tecnologia embarcada e agora estamos aplicando essa filosofia nos novos produtos e nas atualizações dos modelos antigos", diz Tonissi.
Ao longo de 30 anos, a empresa já desenvolveu e lançou oftalmoscópios (utilizados em exames de fundo de olho), topógrafos de córnea (para análise da curvatura da córnea), campímetros de projeção (para medir o campo visual), um microscópio especular (para caracterizar células do endotélio) e um sistema de luz ultravioleta para terapia Crosslink (utilizada para reforçar a estrutura da córnea). Essa experiência acumulada será fundamental no processo de aprovação do novo retinógrafo de baixo custo pelas agências regulatórias, avalia Tonissi.
"Depois de lançar muitos produtos ao longo dos anos, acumulamos bastante experiência com o caminho para a aprovação de um equipamento para saúde, que é bastante tortuoso e complicado no Brasil, envolvendo grande volume de regulações", explica Tonissi, que é engenheiro eletricista formado pela USP em São Carlos, com mestrado em física aplicada no IFSC.
Agora, com o projeto já concluído, a atuação da empresa está voltada para a certificação do novo retinógrafo pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que deverá demorar no mínimo um ano, de acordo com Tonissi. Segundo ele, são muitos passos e, mesmo quando as exigências são seguidas à risca, muitas vezes é preciso realizar mudanças no projeto.
"Tudo será avaliado: a emissão eletromagnética radiada e conduzida, a suscetibilidade a descargas elétricas eletroestáticas, o plano de validação de softwares, uma avaliação de gerenciamento de riscos e processos de ecorresponsabilidade. Depois de tudo, o processo passará por uma auditoria para avaliar se está dentro das melhores diretrizes de boas práticas”, detalha.
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