Museu Nacional do Rio de Janeiro, devastado por um incêndio em setembro de 2018 (foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)
Tema foi debatido durante a 7a Conferência FAPESP 60 anos. Participantes apresentaram propostas que poderiam ajudar as instituições a superar a falta crônica de recursos
Tema foi debatido durante a 7a Conferência FAPESP 60 anos. Participantes apresentaram propostas que poderiam ajudar as instituições a superar a falta crônica de recursos
Museu Nacional do Rio de Janeiro, devastado por um incêndio em setembro de 2018 (foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)
José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – Grandes tragédias fizeram encolher o patrimônio cultural do Brasil nos últimos anos. Basta lembrar os incêndios do Museu Nacional, em 2018, e da Cinemateca Brasileira, em 2021. Na opinião dos entendidos, esses foram desastres anunciados, que cedo ou tarde estavam fadados a acontecer dado o grau de descuido em que se encontravam esses equipamentos públicos, estrangulados pela falta de recursos e pelo descaso dos poderes pretensamente responsáveis.
O tema foi objeto da 7a Conferência FAPESP 60 anos, realizada ontem (08/12). Intitulado “Gestão e Políticas para o Patrimônio Cultural”, o evento on-line teve a moderação de Renata Vieira da Motta, presidente do Comitê Brasileiro do Conselho Internacional de Museus (Icom Brasil). E reuniu dois especialistas de alto nível: Carlos Augusto Calil, da Universidade de São Paulo (USP), e Nivaldo Vieira de Andrade Junior, da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Calil é professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA-USP), ex-diretor da Embrafilme, da Cinemateca Brasileira e do Centro Cultural de São Paulo e ex-secretário municipal de Cultural São Paulo, entre 2005 e 2012. Andrade Junior é professor da Faculdade de Arquitetura da UFBA, ex-presidente nacional do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e membro do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Participou da abertura o professor Luiz Eugênio Mello, diretor científico da FAPESP.
“Conheci o Museu Nacional em 1979. E, desde aquela época, o incêndio estava ‘contratado’. Só faltava preencher a data”, disse Calil, que enfocou o tema sob a perspectiva histórica, apontando as muitas mazelas e as poucas, porém promissoras, vitórias. O professor da ECA-USP destacou especialmente a atuação do Iphan, cuja sobrevivência, por mais de 80 anos, classificou como “prodigiosa”.
Indo além da simples constatação, Calil apresentou algumas propostas que poderiam levar as instituições voltadas ao patrimônio cultural a superar sua crise crônica: desvincular a gestão dos governos, transformando-a em instância do poder público não sujeita ao jogo eleitoral e aos interesses partidários; conferir-lhe autonomia para que os dirigentes possam negociar com os setores públicos e privados; dotar as instituições de fundos de recursos, emancipando-as das contingências orçamentárias; dar mandato às diretorias, para que não sejam trocadas a cada mudança de governo; e, finalmente, criar uma cultura de execução financeira equilibrada.
“No Brasil, não existe cultura de colaboração entre os entes governamentais – nem sequer no interior do mesmo partido ou entre as diferentes pastas do mesmo órgão público”, afirmou Andrade Junior, que tratou especialmente do patrimônio edificado, arquitetônico e urbano, da cidade de Salvador.
O arquiteto informou que, no centro antigo de Salvador, há 1.500 imóveis sem uso e em processo de degradação. “A privatização não deveria ser encarada como um tabu nem como uma panaceia. Há muitos imóveis que poderiam ser privatizados. Mas é um absurdo transformar um edifício simbólico como o Palácio Rio Branco, antiga sede do governo da Bahia, em hotel de luxo, como está sendo feito”, ressaltou.
Andrade Junior citou como exemplo a ser seguido a gestão autônoma do patrimônio cultural de Quito, no Equador.
Parceria público-privada
Desenvolvendo o tema da relação público-privada na sessão de perguntas e respostas, Calil disse que a parceria é inevitável. “Mas não pode ser a administração privada dos recursos públicos. É preciso que haja contrapartida. Transferir 100% de recursos públicos para o setor privado é algo que não existe em nenhum outro país do mundo”, argumentou.
Tanto Calil quanto Andrade Junior ressaltaram a necessidade de um terceiro ator nessa composição: a sociedade civil, seja ela organizada ou constituída pela população local, diretamente envolvida. Um exemplo auspicioso é a Sociedade Amigos da Cinemateca (SAC), que reassumiu o seu protagonismo tendo o próprio Calil na presidência.
Para assistir ao evento na íntegra acesse: fapesp.br/15201/.
Os vídeos das seis conferências anteriores estão disponíveis em: 60anos.fapesp.br/conferencias.
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